Em política, aliás, como nas coisas da vida há um começo. Uma espécie de esboço que pode não retratar de imediato toda a situação, mas as baias de um quadro futuro.
No caso que abordamos PS e PSD sentaram-se à mesa de negociações e definiram áreas de aproximação, o que para bom entendedor significa que podendo entender-se naquelas áreas, os interessados irão eventualmente avançar noutras de maior complexidade. Branco é, galinha o pôs.
A jigajoga protagonizada por Rui Rio vai desde Marcelo, Presidente, a Costa, Primeiro-Ministro, e passa pela hostilidade forte dentro do PSD, a começar pelo setor mais visível que é o grupo parlamentar. Aqui diga-se que Negrão, no debate de quarta feira, estendeu a passadeira a Costa para ele passar à larga.
Salazar dizia que em política o que parecia, era. Não irei tão longe, mas o esboço que se está a desenhar tem o seu quê de real.
Rio ataca o PS, mas aconchega-se a Costa, apontando as tais possibilidades de acordos sobre fundos estruturais e regionalização. O parceiro de coligação do PSD no governo teve quinta feira um almoço com Rio após os realizados com Costa e Marcelo. Ficou para último.
Se, por acaso, sobre as duas questões houver acordo, António Costa fê-lo antes de o alcançar com o PCP, o Bloco e os Verdes, o que tem um grande relevo político.
Um acordo do PSD com o PS, nestas circunstâncias, na sequência de um anterior quadro de confronto entre os dois partidos, valerá como promessa de possibilidades de novos acordos, mesmo que o seja só no plano psicológico.
Quando Marcelo, do alto do seu populismo, considera que talvez não haja tempo e sugere pressa tendo em contas as próximas eleições legislativas, há um pé no acelerador e outro no travão.
O pé no acelerador tem a ver com a pressa em mostrar (os temas que se diz que terem o apoio de Belém) que sobre questões importantes pode haver mais facilmente acordo com o PSD do que com os parceiros das esquerdas.
O pé no travão tem a ver com a possibilidade da rebelião no interior do PSD que o poderá levar a perder influência eleitoral, face à possibilidade de capitalização do CDS à direita, e no temor do PS vir a ter maioria absoluta.
Os dados parecem estar lançados e as duas reuniões de Marcelo com Rui Rio mostram até que ponto o mais alto magistrado da nação parece estará “seguir” (pelo menos) o cozinhado que Rio está a preparar, independentemente do caldeirão dos deputados ter entrado em ebulição, o que pode levar ao esturro e Marcelo a temer as consequências. Este cozinhado, diga-se desde já, não consta das atribuições constitucionais do PR.
O certo é que há algo de novo entre PS e PSD; deixou de haver a guerra permanente e abriu-se em período que já não é apenas de tréguas, mas de comissões de ambos os partidos a reunirem para estudar acordos.
Não é pouco. É algo que não é só novidade. É também uma possibilidade para Costa e Rio, mesmo que aquele repita que só diz respeito aos chamados consensos alargados, pela simples razão que ainda nem sequer os tem com os parceiros que o apoiam na Assembleia da República.
O esboço que abarca São Bento, Belém e São Caetano, revela várias turbulências; desde logo na geringonça e, como se vê a bom ver, dentro do PSD que tinha criado ao longo destes dois anos uma equipa sempre pronta a atacar o PS e a juntar-se ao CDS.
Rio enfrenta o próprio PSD. Costa eventualmente os seus apoiantes na Assembleia da República. Os desafios são de monta. Se não valessem a pena (para ambos) não iriam desencadeá-los. Não faltará muito para se saber o que aí vem. Temos, à vista, uma jigajoga para vir a substituir a geringonça?