Costa na entrevista ao Público de 20/02/23 centrada na Europa e na guerra na Ucrânia por certo escolheu a ocasião e o conteúdo, tendo em conta o que se discute naquelas instâncias, entre aviões, anfiteatros, hotéis e grandes salas cheias de jornalistas. Como se constata, em Portugal, pouco se fala e menos se discute sobre o atual funcionamento da U.E. e o seu destino.
Costa assume um orgulho de ter sido Portugal e a Alemanha os únicos que se chegaram à frente para enviar para a Ucrânia os Leopard 2 modelo A6.
Portugal está hoje no quadro da NATO na Roménia e na Lituânia, junto das fronteiras da Rússia, sublinhou. Acha muito bem que os orçamentos da chamada Defesa subam para 2%. Esclarece que quando os portugueses chegam às caixas dos supermercados e sentem a inflação não se lembram de Putin, mas sim dele. Não esclareceu porque há tantos milhões para a indústria da morte e não há para pagar o tempo de desconto congelado dos professores e para aumentar os salários baixos da imensa maioria da população, incluindo da Função Pública.
Passa em revista o que se discute na U.E. sobre os alargamentos da Ucrânia e dos Balcãs e assumindo-se (com o que ainda não é) explica “…É mais fácil para mim tornar-se o campeão das adesões e depois daqui a sete anos alguém vai dizer a culpa é daquele irresponsável que tomou decisões sem ter isso em conta…” Aparentemente Costa chega-se à frente quanto a quem tem a capacidade de decidir e parece que não quer ser julgado como sendo o campeão das adesões, mas a verdade é que dá a sentença.
No seu entendimento Putin teve várias derrotas estratégicas: uniu a Ucrânia, reforçou a coesão da U.E e revitalizou a NATO. Com base nestes dados e na grosseira violação do direito internacional, a Rússia tem de ser derrotada militarmente, só essa derrota pode evitar o que chama a via eterna para um conflito; não deixando de fazer uma crítica implícita aos defensores de uma defesa autónoma da Europa apontando sem reservas à articulação com a NATO, o Reino Unido e os EUA.
Naturalmente que neste contexto atlantista/militarista teria de aparecer um rasgado elogio na Durão Barroso…”, o tal que ofereceu a George W.Bush, a Blair, e a Aznar os Açores para mentirem ao mundo e desencadearem uma invasão e uma guerra que causou centenas de milhares de mortos e nenhum deles até hoje foi levado a qualquer Tribunal Penal Internacional. Para enforcarem Hussein não hesitaram em lançar aqueles países e depois a pacifista NATO naquela louca aventura belicista. Na altura a Europa tinha gente com dignidade e nem Chirac, nem Schröder, nem Soares alinharem na aventura pintada com o monumental embuste das armas de destruição massiva, por acaso já utilizadas pelos EUA em Hiroshima, Nagasaki e no Vietnam com armas químicas. Percebe-se também o ditirambo a Barroso, se calhar vai precisar dos seus correligionários.
Há dois patamares nesta entrevista, um óbvio – Costa em termos da guerra na Ucrânia está perfeitamente sintonizado com toda a direita e com a política imperial dos EUA. Costa vai mais longe, a sintonia é feita ainda com a recalcitrante política externa do Reino Unido que só tem o militarismo para se apresentar em grande perante o mundo; aliás Macron segue as mesmas pisadas, apenas com mais savoir-faire, dado que a sensibilidade do psicadélico Johnson e do multibilionário Rishi Sunak é próxima da nulidade.
O nosso António em bicos de pés não hesita criticar do alto da estatura de político com futuro atacar os hesitantes que mesmo timidamente se afastam do Great Uncle Sam e ousam pensar em autonomia europeia, renegando tais ideias perigosas para a tal derrota militar da Rússia.
O outro patamar está longe de Lisboa e Costa fala para os seus pares (já deve ter encarregado os seus assessores de ter enviado cópia da entrevista para Bruxelas e arredores) mostrando que podem contar a cem por cento para a tal derrota.
O que Costa tem para oferecer aos portugueses em termos de propostas para a guerra da Ucrânia é tão só isto: tanques Leopard 2 que à exceção da Alemanha mais ninguém enviou, mais armas, soldados para a Roménia e Lituânia ao serviço da política militarista de cerco à Rússia. Imaginemos o que aconteceria ao mundo se a China ou a Rússia tivessem ao longo das fronteiras com os EUA países com armamento nuclear chinês ou russo.
E não passa disto, a guerra, segundo o Marechal Costa, durará enquanto a Rússia não for derrotada, o que vale por dizer que se a Rússia não for derrotada nos próximos anos a guerra e os seus horrores diretos e indiretos prosseguirá. Ou seja, a guerra é para continuar.
Quando ele afirma que este é o consenso dos portugueses fica o repto, querem os portugueses que o seu governo os envolva numa guerra pelos vistos sem fim, enviando armamento e homens para as fronteiras da guerra? Se é até à derrota da Rússia, tal cenário admite o cenário de tropas europeias e de Portugal entrar no conflito? Costa, agora Marechal da EU/NATO, tem o dever de esclarecer.
Costa, além de não se importar das consequências deste grau de envolvimento de Portugal na guerra, vira as costas aos dirigentes dos PALOP e fica bem amarrado ao eixo Washington/Bruxelas. Um socialista convertido ao militarismo. Tira-se-lhe o chapéu pela frontalidade. A sua alma já não está em Lisboa.