Conheci Carlos do Carmo em 1976 na Rua da Saudade, ora em casa do Fernando Tordo ora na do Ary dos Santos, eram em cima uma da outra. Nesses longínquos convívios exaltantes, à espera dos dias felizes para sempre, tínhamos abolido as fronteiras entre o dia e a noite. Sonhávamos. E sonhávamos. Não havia mais espaço nas nossas vidas.
O Ary criava as letras e os músicos arranjavam-nas. Naquelas duas casas os sonhos tinham a dimensão da revolução, da música e a música a do sonho de um Portugal feliz. A palavra sonho será um lugar comum, mas nem por isso sonhar deixa de ser sonhar. Pensávamos no país à imagem do sonho. A diferença era entre viver com o impulso do sonho ou viver como calhar. Sonhávamos.
O Carlos era dos convivas o mais sereno. E assim o conheci sempre. Serenamente comprometido com o povo da sua cidade e do seu país. Um homem na cidade que amava, E do mundo que percorria com ternura. A sua voz era limpa, serena como a luz de Lisboa, versátil, terna, doce, apaixonada, arrebatadora. Uma voz que se ouvirmos bem está em todos os cantos da cidade de Lisboa. Ponham o ouvido à escuta. E vão em busca das melodias que nos encantam e que são o chão onde o Carlos foi cantar os putos, o Tejo, o castelo, as castanhas, as andorinhas, os elétricos, o céu e o amor. Já não há Lisboa sem a voz do Carlos. É um amor tão recíproco que jamais se separará. Agora e sempre. O Carlos não morreu tendo morrido. Atingiu a eternidade. Abraçado ao fado fará parte de todos nós hoje e amanhã. Sempre.
Curiosa ou estrategicamente, durante o dia de ontem não vi nem ouvi uma única palavra sobre o relacionamento entre o Carlos do Carmo e o PCP.
Estranho ou talvez não…
Abraço
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