Será que, nós humanos, não temos capacidade para nos mantermos como seres capazes de viver uns com os outros? Será?
As guerras não ocorrem ao acaso; nascem de preparação anterior. O primeiro passo implica a acumulação de armas. A corrida às armas tem em vista defender-se do “inimigo”. Todas as guerras se justificaram desta maneira. A da Ucrânia não constitui exceção nesta matéria.
Todas as partes foram acumulando armas: Rússia, Ucrânia e NATO.
Depois do golpe de Estado da Praça Maidan, em 2014, liderado por Vitoria Nuland, (a tal que queria que a UE se fod—e) tudo acelerou. A Rússia tinha pressa para impedir que a Ucrânia se continuasse a armar, como foi já esclarecido por François Hollande, Angela Merkl e Poroschenko; a NATO/EUA/UE partiam do pressuposto que derrotariam a Rússia com as sanções económicas, desligando-a do mundo.
Em grande medida, por essa razão os EUA, que tudo fizeram para derrotar a Rússia, salvo envolver-se diretamente (o que conduziria à 3ª guerra mundial- talvez a última- parece quererem desligar-se da aventura militar e deixar a UE a continuar a fornecer armas à Ucrânia (compradas aos EUA) e até, quem sabe, segundo alguns dirigentes de países importantes envolverem-se no território ucraniano, levando o continente para muito próximo do braseiro nuclear.
Ursula von der Leyen, António Costa, Kallas e outros engoliram o disco da corrida aos armamentos. Há dinheiro a rodo para a indústria da morte. Não o há para a saúde e para a habitação, mas há 800 000 milhões de euros … para armas. Diz da loucura em que vivem os dirigentes europeus, fechados numa bolha onde não entra a vida das populações e dos povos europeus.
Instigam a corrida aos armamentos, como recentemente Durão Barroso, em entrevista ao DN de 22/04/2025 que demagogicamente invoca os filhos e os netos para justificar a corrida aos armamentos, dado o aparente nexo de causalidade entre viver em paz e acumular armamento.
Historicamente, sempre que se defendeu a corrida aos armamentos para conter uma ameaça acabou por desaguar na guerra. Aliás, o próprio Durão Barroso tem um historial sinistro no que toca à defesa da guerra, pois garantiu-nos que o Iraque tinha armas de destruição massiva e bem sabia que era mentira. Que autoridade pode ter alguém que para capacho dos EUA se prestou a este infame papel?
A corrida aos armamentos e consequente acumulação de armas tem pelo menos dois objetivos: entregar aos grupos económicos que se dedicam à indústria armamentista a exploração de novos investimentos que darão maior percentagem de lucro que a indústria em crise e muito provavelmente jogar na guerra em condições que não degenerem numa guerra mundial no pressuposto que a Rússia não suporte o esforço de guerra e leve à queda do regime.
E, neste clima de histerismo armamentista que está em preparação a entrega de parte ou de todos os fundos da Segurança Social a Fundos privados e, em nome do esforço armamentista, e criar o risco de fazer as pensões entrar na roleta do mercado bolsista.
No dia do apagão um vizinho antes de se saber exatamente o que se estava a passar dizia-me que tinha sido o Putin a cortar os cabos submarinos…imagine-se a eletricidade a chegar por esta via. Na verdade, o clima de intoxicação de massas é realmente assustador. Droga a mente das pessoas. Impede-as de usar a razão.
Como escreveu o grande escritor e emérito pacifista, Stefan Zweig, …exigir imparcialidade durante a guerra é pueril, pois a guerra é indiferente a esses princípios, e até necessita precisamente de uma constante excitação que mantenha o entusiasmo pela causa própria e o ódio ao adversário…in “O mundo de Ontem”, editora Livraria Civilização; daí as penas de prisão bem pesadas na Rússia e a censura a tudo quanto é russo na UE, muito para além do praticado na guerra fria. E o bater na tecla cega e acéfala, durante este tempo todo, da necessidade imperiosa de derrotar estrategicamente a Rússia, o que até hoje não se verificou.
Trata-se, como é bom de ver, de uma partida cujo resultado é não só imprevisível, como também altamente perigoso.
Ninguém sabe o ponto em que este confronto bate no limiar do que a Rússia possa considerar que está em causa o problema existencial. Por muito menos John Kennedy ameaçou a URSS com um ataque nuclear quando os soviéticos estacionaram mísseis nucleares em Cuba.
Os EUA ao “abandonarem” a Ucrânia não o fazem por motivos pacifistas e construtivos. Fazem-no porque estão a perder a guerra. Ou escalam para o patamar nuclear ou retiram-se para esconder a derrota no conflito. É aqui que bate o ponto.
Apesar do mundo alucinado e desvairado de Trump, a Administração no seu conjunto, foi levado a tomar um banho de realismo, e que mostra o declínio do Império e simultaneamente a capacidade de apreender que o mundo mudou e não há MAGA que faça o tempo voltar para trás.
É estranho e bizarro que o continente das guerras mundiais, de cem anos uma outra, continue perdido nos sonhos de grandeza imperial definitivamente arredados do palco. Quando Ursula von der Leyen ou Kallas ou António Costa carregam no acelerador do carro da guerra que representam para os povos europeus? Continuar o projeto de se submeterem aos EUA e comprarem-lhe armas, anunciando publicamente o seu desacordo com as negociações sobre a Ucrânia e uma autonomia estratégica para inglês ver.
Já perderam de vista o projeto pacifista de uma Europa de paz e de coesão social, o objetivo mais nobre desde a existência da Europa, mas para tal era necessário confiar nos povos da Europa e não partir de uma estratégia dirigista e burocrática afinada com os EUA para impor aos povos europeus a política neoliberal que devasta o mundo, como bem esclareceu no seu livro “Fratelli Tutti” o saudoso Papa Francisco.
A Europa vai de Lisboa aos Urais. Foi engendrada em múltiplos confrontos. Deve-se ao saber de homens de todo os países, desde Sócrates a Platão, Ovídio a Plutarco, Shakespear a Tolstoi, Roman Rolland a Goethe, Petrarca a Cervantes, Camões a Espinoza e a tantos e tantos europeus que com a sua arte, conhecimento e sabedoria imaginaram a nossa civilização e a fizeram avançar.
Não podemos permitir que regressemos à barbárie. É preciso que mulheres e homens esclarecidos levantem as suas vozes e consigam que a guerra na Ucrânia se resolva à mesa das negociações e certamente com concessões de parte a parte.
Precisamos de dar uma volta de 180 graus e usar afinal os recursos que existem para resolver os problemas reais que afetam os cidadãos dos países da UE, designadamente a habitação, a saúde, os serviços públicos e a degradação ambiental.
A intoxicação e manipulação dos governos e da maioria dos media funciona como uma droga para anestesiar a consciência e a razão humanas. Depois de tantas desgraças e guerras em solo europeu é caso para perguntar se ainda não estamos cansados de centenas de milhões mortos. Será que a essas montanhas de mortos queremos juntar o braseiro nuclear? Será que nós humanos não temos capacidade para nos mantermos como seres capazes de viver uns com os outros? Será?