A beleza da música do Cáucaso na Gulbenkian

Vardan Hovanissian é turco e toca saz, uma espécie de alaúde. Emre Gültekin é arménio e toca duduk, um instrumento de sopro, popular no Cáucaso.

Correm o mundo a tocar e a cantar juntos, contrariando as relações tensas e dolorosas entre a Turquia e a Arménia.

No início do concerto chega-nos a alma das montanhas, uma sensação arrebatadora e simultaneamente serena.

Uma espécie de tristeza que nos acompanhará sempre, mas que de cima da montanha ganha outra expressão. A tristeza de que nos falava Vinicius de Morais.

 É curioso que a tristeza sobe apertada pelo ritmo impetuoso da melodia até explodir na mais densa alegria policromada que nos impele a bater com os pés no chão, a saltar e a imaginar as cabriolas das danças de grupos de homens nas montanhas caucasianas.

O duduk toma conta da nossa mente, leva-nos pelo sonho, por um mundo melodioso onde os homens e mulheres vão em busca do melhor da vida, da beleza, tanto basta para ser melhor. O sopro é como um chamamento ao nosso interior, às nossas tristezas, às nossas alegrias, ao que fomos e ao que seremos.

O saz acompanha esta toada e, às vezes, escapalha-lhe e segue à frente e, então, o duduk responde e acelerando os ritmos (quase sempre) e transformando uma canção de amor numa música arrebatadora de ritmo e um tropel de alegria.

Esta música das altas montanhas caucasianas é densificada de mistério, amor, tristeza, alegria que todos os humanos encerram.

Subimos na música às altas montanhas e dali talvez se veja melhor o mundo. Essa visão permite encarar a nu a dialética entre a tristeza e a alegria.

É verdade que a verdadeira alma humana está onde estiver cada um de nós. Mas não será menos verdade que ao ouvirmos estes dois músicos tocar tão antigos instrumentos somos conduzidos  ao reduto mais recôndito de nós, aonde nos sentimos humanos, aonde a tragédia entre Arménia e Turquia desaparece e a música de ambos vale como um suspiro de vida e de beleza.

Há momentos que nos aconchegamos tanto às melodias que pensamos que não deviam acabar e se deviam prolongar até os nossos ouvidos e os nossos olhos em diálogo dizerem-nos basta, estou feliz. Não chegou esse momento ao longo do concerto. Como uma despedida em que já só pensamos no próximo encontro. Bem hajam.

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