Passos Coelho ganhou com o tempo um ar solene como aquele que garantiu ao pé do Cartório Notarial que se fosse primeiro-ministro não aumentaria impostos, não cortaria salários e não permitiria despedimentos na Função Pública. Foi o que se viu. Entretanto, na sua órbita de aparecer e desaparecer como o Cometa Halley, no dia 16 de junho teve uma aparição no lançamento de um livro de António Alvim “Um manual para mudança da saúde” com Carlos Moedas na primeira fila (parece que desta vez foi realmente convidado) para voltar a um tema velho e revelho de quarenta e tal anos, desde a formação da AD – as reformas que não têm fim à vista.
O país não pode viver sem reformas, desde logo no SNS, disse ele, acrescentando que é um paradoxo ser “…o que se chama de direita sempre a tentar salvar a situação e ver se lhe consegue dar sustentabilidade…”.
Na sua arenga continuou a clamar pelas tais reformas a serem feitas seja de que maneira seja, enviando um recado a Rui Rio que anda, desde que chegou a líder à espera do PS. Explicou a Rui Rio “…se as reformas tiverem de se fazerem em confronto que se façam, também é importante que a democracia funcione para isso… “
Sem nunca explicar entre quem seria o confronto e em que consistiriam, puxou de uma bandeira sempre agradável, nomeadamente numa situação de descrença política, contra o rumo do país, apontando sem nunca o referir um novo programa de empobrecimento dos que vivem do seu trabalho e de enriquecimento acelerado para os que aproveitariam dessas reformas.
É preciso desfaçatez vir acusar a esquerda de não querer um SNS com sustentabilidade quando acaba de dar resposta satisfatória aos portugueses em plena pandemia, mesmo desfalcado por políticas de direita que o querem colocar ao serviço dos grupos privados de saúde e que em boa medida conseguiram com o asfixiamento das carreiras dos operacionais, enfermeiros e médicos, com o desinvestimento e encerramento de serviços quase em simultâneo com a abertura desses espaços e serviços pelos privados.
Qual é a reforma que Passos Coelho pretende para o SNS? Torná-lo mais eficaz com investimento necessário ou prosseguir a senda do seu desastroso mandato de quatro anos a desinvestir no SNS e a abrir às claras ou encoberto áreas aos privados? Não disse o que pretendia, mas percebe-se.
Em Portugal, os privados podem investir na saúde e mostrar do que são capazes, só que o jogo fica viciado se o fizerem através do Estado que, em vez de o defender para todos, o tornarem burocrático, inoperacional, incapaz de responder no dia a dia, fazendo com que os cidadãos fujam para os grupos económicos privados.
Só que nesta altura em que o SNS, apesar de todas as malandrices que lhe foram feitas, respondeu eficazmente à pandemia, vir falar de sustentabilidade significa entregar o bife aos que “sabem da poda” e encher-lhes os bolsos e deixar o SNS para aquele terço “miserável” como diria M. Tatcher. Existiria para os que não chegassem a tomar seguros que por sinal são detidos pelos mesmos que detêm os grupos da saúde.
Entretanto Rio que se cuide. E o PS que leve a sério os recados de Marcelo. A sintonia ganha contornos. O cometa Halley desconfinou e apareceu em cima dos acontecimentos.