Vieram de um longe longínquo, da India, diz-se. Atravessaram caminhos e não caminhos até ao mar por onde já não passaram por serem caminhantes, muitos ainda o são.
São caminhos de vida e de vidas. Quantos dias, quantas noites, quantos desertos, quantos desfiladeiros? Quantas surpresas, quantas dores, quantos e amores e quantos desamores para chegarem se é que chegaram, pelo menos para muitos deles?
Este foi o rumo de um povo que se arruma nesta Europa que pensa em euros e pouco ou nada em almas.
É esta alma explosiva, melancólica, dorida, alegre, vibrante, sedutora, que Dorantes se inspirou para fazer do seu flamengo o cume mágico com um piano, um contrabaixo e uma bateria.
O piano de Dorantes é em linguagem kantiana a essência do sublime, a pureza da música, o deleite de sentimentos e sensações únicas que só a verdadeira arte proporciona.
E quando a elegante bailarina surge para fazer da música dança, para nos deixar como que baralhados de tanta harmonia, mesmo quando o tapeado nos leva ao ilimitado.
Ela logra a estilização do flamengo na linha do piano do mestre, envolvendo o espetador num ambiente denso de sentimentos arrebatadores e embaladores consoante a proposta que é feita.
Dorantes faz fruir o ritmo próprio do flamengo onde cabe o universo “gitano”, embora aberto a outras estéticas mais exigentes.
Neste Flamengo Atlântico que aconteceu na Aula Magna tudo casa na perfeição.
Para terminar Dorantes vai ao piano inventar o percurso do seu povo até à Andaluzia e solta em notas o martírio, o amor, a coragem, a raiva acompanhado pelo belo e doce sorriso da bailarina cuja dança se eleva na música do trio de músicos.
São momentos que transformam a nossa humanidade em algo mais profundamente humano que é o que a arte é capaz de fazer.