Aí está Trump, o isolacionista, o que falava de regresso às fronteiras da América do Norte, afinal de regresso à velha América intervencionista. Aliás como não podia deixar de ser, se se pensasse um pouco e não se deixasse levar por instintos como Donald Trump.
Num primeiro instinto, disse Trump queria tirar as tropas do Afeganistão, num primeiro instinto, o homem a quem os norte-americanos elegeram como presidente, atirou para o ar o que sabia cair bem junto de grandes faixas do eleitorado.
Mas não só em relação ao Afeganistão; fê-lo com a NATO e semeou aos ventos a ideia de que, com ele na presidência, a América estaria primeiro ; daí instintivamente a adesão desses segmentos das população ao homem dos instintos.
Trump faz lembrar um velho rufião manhoso, conhecedor dos lados podres dos EUA, de onde veio e que cultivou a imagem de um homem fora do establishment , um homem fora da política e de sucesso nos seus mega negócios.
Ele sabia que aquela era a imagem que vingaria num primeiro instinto em todos os descrentes nos políticos do país.
Segundo a sua filosofia, nele podia-se confiar porque o caminho que percorrera era o do sucesso privado, em contraste com o mundo do Congresso e da política.
Seria o homem para endireitar a América em perda de força, e ele sabia como dar-lhe a força perdida, a tal “Great America” ou “America first”… Quem nestas largas camadas sociais não quereria o regresso das tropas espalhadas pelo mundo? Quem entre estes americanos não quereria voltar a ver a América como terra de sonho? Quem?
Trump vai mostrando ao mundo que saber manejar o Twitter não é suficiente para dirigir a nação mais poderoso do mundo.
Ao longo destes angustiantes meses de Trump na presidência, cada vez se vai tornando mais claro que ele não tem um programa de governo e vive aos solavancos e às guinadas, criando fantasmas e escondendo-se da realidade atrás de mensagens em que as de ontem se atropelam com as de hoje.
Um homem com estas características é facilmente domado pelos poderes estabelecidos, organizados em torno de altos interesses, como os do complexo militar-industrial.
Trump foi chamado “à ordem” pelos generais do Pentágono e tal recomendação bastou para que em vez de tirar as tropas do Afeganistão, ele anunciasse o reforço da presença militar por tempo indeterminado.
O fanfarrão precisava de uma fanfarronice e, como vive de instintos, alegou que não diria nem como as tropas agiriam , nem quando sairiam, mas apenas que ficariam lá a matar terroristas… tal como todos desde Bush.
É verdade que devem ter conseguido matar centenas ou milhares de talibans, mas não deixa de ser verdade que o Afeganistão é hoje um país inseguro e incapaz de fazer frente aos talibans que os EUA proclamaram com Bush terem derrotado. Estranho e bizarro fenómeno. Tão bizarro que Obama aceitaria negociar com os talibans um acordo, não obstante os EUA terem proclamado a sua derrota.
Os talibans e os serviços de inteligência paquistanesa são unha com carne porque assim foram instruídos pela CIA e outros serviços dos USA.
O Paquistão é o grande aliado dos EUA na região e a retórica de Trump visa justificar a humilhação de ter de desdizer o que apresentou como uma das grandes ideias da sua campanha.
Nos EUA o Presidente manda quando manda, mas quem manda a sério, como se está a ver, são os generais que Trump tanto enaltece.
Este tipo de personagens são perigosos porque vivem ao sabor dos ventos e são levados por quem tem o leme das decisões importantes e cria a corrente dominante, como é o caso da política externa de que em certa medida o mundo depende.
Armado em valentão, durante a campanha, contra a política dos EUA no mundo, aninha-se agora e como um bom rapaz e justifica-se dizendo que na sala oval as coisas são diferentes.
Não fará frente aos interesses instalados e continuará com a verborreia que habituou a América e o mundo, mas na sala oval será o cordeirinho dos generais do Pentágono. Assinará o reforço por tempo indeterminado o reforço das tropas no Afeganistão. Como um imperialista de gema.