O Cáucaso, região historicamente altamente cobiçada, palco de tantas guerras, é a ponte entre a Ásia e a Europa por via terreste. A rota da seda atravessou a região.
Foi palco de invasões e conquistas ao longo da História – gregos, romanos, mongóis, árabes, persas, turcos, russos, sós ou aliados tentaram dominar a região.
Nestas guerras de domínio, as religiões estiveram sempre presentes (paganismo, zoroastrismo, sunitas, chiitas, cristão ortodoxos e arménios), sendo o maior confronto entre cristãos e muçulmanos.
As deportações eram banais nos vários impérios que dominaram o Cáucaso e a URSS não ajudou a sarar feridas, nalguns casos juntou-lhe sal, designadamente com Staline e a deportação de um lado para o outro de povos em troca de paz com os contendores de sempre – russos, soviéticos, turcos e iranianos.
A guerra na Ucrânia ainda tornou o Cáucaso mais central na geopolítica – a proposta da nova rota da seda torna inevitável atravessar a região.
A Rússia pela sua situação geográfica e pela sua História não deixa de ter em conta o envolvimento dos EUA/NATO nestas paragens e, por outro lado, tem dificuldade em manobrar pela guerra que conduz na Ucrânia e pelas suas alianças mais ou menos ambíguas, como são exemplos com o Irão e a Turquia.
A implosão da URSS levou à independência por referêndum da Arménia, Geórgia e Azerbaijão, entre outras Repúblicas. Só que no Azerbaijão manteve-se o famoso enclave de Nagorno-Karabah com população arménia, sendo que esta população criou o seu próprio Estado dentro do Azerbaijão (Artsakh), saído da guerra em 1988 e declarando que o enclave fazia parte da Arménia. Ou seja, a ONU reconhecia o Azerbaijão onde se incluía Nagorno-Karabah, mas este enclave era dirigido pelos arménios. Tal facto deveu-se à ajuda da Rússia em 1988 que conduziu à derrota militar dos azerbaijanos – 30.000 mortos.
Entretanto, o Azerbaijão com muito mais recursos (gás e petróleo) e capacidades tecnológicas e mais população, o triplo da Arménia, em setembro passado esmagou a direção político/militar de Nagorno-Karabah onde pontuavam oligarcas e alguns indivíduos sem escrúpulos.
O Azerbaijão concretizou o seu velho sonho de expulsar do seu território os arménios do enclave de Nagorno-Karabag.
Estive nos dois países neste final de setembro e início de outubro e as campanhas belicistas de um lado e outro eram mais que evidentes. Do lado do Azerbaijão as bandeirolas nos prédios e os recibos das compras continham a frase – Karabah é do Azerbaijão; do lado dos vencidos, placas a manifestarem o apoio ao Artsakh.
Parece ser claro que o governo de Pashinyan (1º ministro da Arménio) tinha consciência da sua impossibilidade de fazer frente ao Azerbaijão. Iniciou uma manobra que consistiu em fazer crer que a esperada derrota arménia resultou da falta do empenho da Rússia em defender os arménios (tradicional aliado da Arménia), aproximando-se dos EUA, realizando exercício militares conjuntos, enviando a esposa a Kiev para apoiar Zelenski e fazendo lançar nos media uma campanha contra a falha da Rússia e que teve o apoio do N.Y. Times e outros grandes jornais ocidentais, em países onde a diáspora arménia é muito significativa (EUA e França). Realça-se a impressionante campanha em torno da adesão da Arménia ao TPI, apesar de um quarto dos votos contra no parlamento arménio.
A eventual mudança de aliado da Arménia trocando a Rússia pelos EUA e França, ou a chantagem e manobrismo, veio trazer à região este novo ator de peso e fazer escalar a tensão entre aquelas duas potências.
Na verdade, a Turquia apoiou a investida azerbaijana que teve outro apoio relevante, Israel. O equilíbrio da região reforçou o peso do Azerbaijão e da Turquia. A Rússia conta com uma certa neutralidade turca na guerra da Ucrânia. É evidente a afirmação turca como potência regional, competindo com o Irão e a própria russa a prazo.
A entrada dos EUA na região a partir da Arménia vai agravar a tensão com a Rússia noutra zona crucial do planeta, será por ali que passará a nova Rota da Seda que entusiasma chineses e russos.
A guerra na Ucrânia tem tendência a alargar os seus limites, este é um perigo muito sério a ter em conta.
Acrescente-se a tudo isto a guerra no Médio-Oriente, iniciada no sábado passado, e que resulta da ocupação dos territórios palestinianos, colocando-se o Ocidente, neste caso, do lado dos ocupantes israelitas. Independentemente das formas de luta do Hamas, há por parte de Israel o incumprimento da Resolução 242 do Conselho de Segurança aprovada em 1967, por unanimidade, e que reconhece o direito à independência da Palestina nos territórios ocupados depois dessa guerra.
https://www.publico.pt/2023/10/10/opiniao/opiniao/caucaso-medio-oriente-arder-2066182